sábado, 4 de fevereiro de 2012

A PROSPERIDADE DOS BEM-AVENTURADOS (Subsidio EBD)


Por Gilson Barbosa


Jesus apresentou aos judeus o governo de Deus. Obviamente eles consideraram um absurdo, pois, inconformados com a escravidão e jugo estrangeiro esperavam que o Messias, vaticinado pelos profetas, os libertasse e expulsasse da sua terra os intrusos invasores; isso traria um sentimento de justiça e liberdade nacional. Porém, quão grande foi à decepção quando Jesus clarificou, a eles, que seu objetivo não era político, mas espiritual.

O autor Lucas informa seus leitores sobre um episódio onde os fariseus indagam Jesus sobre o tempo da implantação do reino de Deus. Eles aguardavam um reino temporal, visível, físico, exterior. Talvez esperassem que Jesus, num momento propício, empunharia armas, reuniria seus seguidores, e montado num vigoroso cavalo anunciaria que o tempo do reinado de Deus havia chegado, e, portanto, deveriam subjugar os romanos. Centenas de anos antes, alguns entre os judeus, haviam decidido não aceitar o jugo sírio sobre a Palestina, no tempo do general Antíoco Epifânio. Este afrontou os judeus, seu modo de vida e sua religião, o que resultou na revolta dos macabeus:

Judas Macabeu encabeçou uma campanha de guerrilhas de extraordinário sucesso, até que os judeus se viram capazes de derrotar os sírios em campo de batalha regular. A Revolta dos Macabeus, entretanto, foi também uma guerra civil deflagrada entre os judeus pró-helenistas e anti-helenistas. O conflito prosseguiu mesmo após a morte de Antíoco Epifânio (163 a.C.). Finalmente, os Macabeus recuperaram a liberdade religiosa, consagraram novamente o templo, conquistaram a Palestina e expeliram as tropas sírias da cidadela que ocupavam em Jerusalém. (Panorama do Novo Testamento – Robert H. Gundry)

O contexto histórico motivavam os judeus a esperarem um libertador do jugo estrangeiro, porém, a resposta de Jesus, quando indagado acerca do tempo de liberdade e do governo de Deus, indicou que possuíam um conceito errado acerca da natureza do reino de Deus, pois este era essencialmente espiritual.

E, interrogado pelos fariseus sobre quando havia de vir o reino de Deus, respondeu-lhes, e disse: O reino de Deus não vem com aparência exterior. Nem dirão: Ei-lo aqui, ou: Ei-lo ali; porque eis que o reino de Deus está entre vós. (Lc 17.20,21)

Nesta lição bíblica, trataremos sobre a natureza ou o caráter dos cidadãos do reino de Deus. Mas, antes, é importante que o leitor entenda o significado do governo de Deus: seu reinado nos corações e nas vidas das pessoas. Porém, por causa do alto conceito das leis deste reino e do seu caráter essencialmente espiritual, penso que ninguém conseguirá atender e cumprir as exigências sem primeiro passar pelo processo da regeneração (Jo 3.3,5). Para tanto, é importante iniciarmos o assunto buscando entender a quem se destina e aplica o Sermão do Monte.

O Sermão do Monte é o primeiro dos cinco grandes blocos do ensino de Jesus em Mateus. É a afirmação clássica da ética do reino de Deus. A igreja primitiva favoreceu uma interpretação literal, porém aplica integralmente o sermão apenas a classes especiais de cristãos, especialmente monásticos. Outros, tais como os anabatistas, tem tentado aplica-lo literalmente a todos os cristãos. Ainda outros o têm considerado como legalista, como um código temporário ou provisório, ou como uma forma realçada da lei de Moisés, com o objetivo de induzir ao arrependimento (Lutero). Finalmente, alguns têm arguido que as exigências do Sermão, não devem ser entendidas literalmente, mas que Jesus mais preocupado com a disposição interior do que com a conduta exterior, ou que a sinceridade do Sermão intentava quaisquer compelir ouvintes a uma decisão a favor ou contra as exigências de Deus sobre suas vidas. (Bíblia de Estudo de Genebra)

Note, leitor, que as exigências do Sermão do Monte são tão valiosas espiritualmente, que houve sempre uma tentativa humana de evadir seus ensinos oferecendo conceitos e destinatários diversos. No entanto, devemos certificar que o Sermão do Monte é administrado através dos discípulos originais de Cristo a toda a Igreja de hoje; o contexto bíblico geral comprova isso. Desta forma, os pregadores da Teologia da Prosperidade deveriam ensinar seus adeptos sobre o caráter dos cidadãos do reino de Deus. Desconfio que esse tipo de pregação não lhes interessa.

AS BEM-AVENTURANÇAS

No presente texto bíblico (Mt 5.1-11) são nove as bem-aventuranças. A pregação de Jesus esclarece que seus seguidores serão muito mais que felizes se obedecerem às normas do reino. Para os judeus, felizes eram os ricos (assim como aos adeptos da Teologia da Prosperidade), os bem-humorados, os bem-alimentados, os que não sofriam nenhum tipo de opressão, os que sabiam reivindicar seus direitos, mas, o coração governado de Deus não se confia nessas coisas, pois sabe que elas são temporais, passageiras e não podem satisfazer a sede da alma. Ao reprovar a avareza Jesus contou uma parábola, em Lucas 12.13-21, sobre o excessivo cuidado temporal que dispunha certo homem. Ele concluiu o ensino demonstrando que a preocupação com a vida eterna deve ser prioridade: “Mas Deus lhe disse: Louco! esta noite te pedirão a tua alma; e o que tens preparado, para quem será? Assim é aquele que para si ajunta tesouros, e não é rico para com Deus”.

A primeira bem-aventurança (5.3) ensina que são mais dos que felizes os pobres de espírito. A tradução Almeida Atualizada traz humildes de espírito; já outra (tradução) verte os pobres em espírito. Prefiro a ultima tradução, pois está mais em conformidade com o ensino espiritual a respeito de ser pobre. Observa que o texto não diz que bem-aventurados são os pobres, mas, os pobres em espírito. A pobreza diz respeito ao aspecto espiritual dos crentes: “Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade” João 4:24. Uma ilustração que podemos usar está em Lucas 18.9-14, na parábola do fariseu e do publicano. O fariseu se considerava mais espiritual (orgulho espiritual) do que os demais, e nesse caso bíblico depreciava o outro que nem mesmo “ousava olhar para o céu, mas batendo no peito, dizia: ‘Deus, tem misericórdia de mim, que sou pecador’”. O publicano (cobrador de impostos) reconhecia sua insuficiência e dependência de Deus, pois sabia da sua natureza pecaminosa. O fariseu habituado com as prescrições legais confiava que era merecedor diante de Deus. Dos 10 mandamentos bíblicos, somos informados que, os judeus acrescentaram mais 608 perfazendo um total de 618 mandamentos. Eles procuravam seguir a risca os mandamentos e praticá-los dava uma sensação de dever cumprido.

Assim são muitos crentes hoje em dia que pensam serem merecedores das bênçãos Divinas somente porque obedecem “as normas da igreja”. Jesus comprova que o fariseu não possuía mérito diante de Deus por observar os mandamentos. Para Deus, mais importante do que a execução das leis do Seu reino é a atitude íntima e pessoal do crente. Assim, a conclusão é que são bem-aventurados os pobres em espírito, os que entendem necessitarem espiritualmente de Deus, os que não confiam em si mesmos, os que se humilham diante da grandeza de Deus e, a eles pertencem o reino dos céus. Esta, não parece em nada com a atitude dos pregadores e dos adeptos da Teologia da Prosperidade.

A segunda bem-aventurança diz respeito aos que choram. Parece estanho esse ensino, mas, precisamos compreendê-lo a luz do versículo anterior, acerca dos pobres em espírito. Não se trata aqui do choro devido às necessidades físicas e terrenas. É verdade que os que servem a Deus, assim como os que não servem, passam pelas mesmas dificuldades nesta vida e por vezes nos lamentamos e choramos. Mas, a ligação lógica do sermão de Jesus, e, por conseguinte a ligação textual do escritor Mateus, comprova que os pobres em espírito choram por reconhecerem seu estado pecaminoso diante da santidade Divina. Choram por verem a impiedade social, pelas transgressões pessoais, pela opressão civil, pela corrupção generalizada que grassa nossa sociedade, pela depravação humana. O apóstolo Paulo reconhecendo a potencialidade do pecado exclamou o seguinte: “Mas vejo nos meus membros outra lei, que batalha contra a lei do meu entendimento, e me prende debaixo da lei do pecado que está nos meus membros. Miserável homem que eu sou! quem me livrará do corpo desta morte? Rm 7:23,24. O choro dos bem-aventurados refere-se a um tipo de pranto em reconhecimento face a nossa natureza pecaminosa que batalha contra o espírito. A bem-aventurança consiste em que os que choram serão consolados. O consolo do regenerado em Cristo é que tanto na vida quanto na morte não pertencemos a nós mesmos, mas ao nosso Fiel Salvador: “Já estou crucificado com Cristo; e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus, o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim” Gl 2.20.  

A terceira bem-aventurança refere-se aos mansos. Contudo, este caráter do cidadão dos céus não deve ser confundido com uma atitude de fraqueza, debilidade, conformismo. Conforme o ensino de Cristo, ela significa “submissão ante qualquer provação, a disposição de sofrer dano ao invés de causá-lo”. Trata-se daquele que mesmo sabendo dos seus direitos civis, por exemplo, “abre mão” deles a fim de não oprimir seu próximo. O manso “é a pessoa que não se ressente, não guarda rancor. Longe de seguir ruminando as injúrias recebidas, ela encontra seu refúgio no Senhor e confia-lhe inteiramente o seu caminho”. Precisamos de mansidão em diversos segmentos da vida: no trabalho, no trânsito, na escola, com o cônjuge, com os filhos, no relacionamento profissional e comercial, entre outros. O manso é aquele que também deve ser pobre em espírito, pois enquanto esta designação descreve como o homem deve ser em si mesmo, aquela, o retrata mais especialmente em sua relação com Deus e com seu semelhante. A bem-aventurança consiste em que herdarão a terra. Esta herança não deve ser entendida somente no sentido escatológico - como o paraíso na terra, segundo entendem as Testemunhas de Jeová. A herança tem sentido espiritual, pois evidencia que os mansos são bem sucedidos espiritualmente e até mesmo socialmente na sua interação com o próximo – de certa maneira é isso que significa “herdar a terra”.

A quarta bem-aventurança trata dos famintos e sedentos de justiça. O primeiro sentido de “justiça”, no Sermão de Cristo, é de caráter forense; o segundo possui caráter ético. O primeiro sentido de justiça trata da conformação humana às leis espirituais de Deus. Nossas obras, sem primeiro ser regenerado por Cristo, não servem para nada: “Mas todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças como trapo da imundícia; e todos nós murchamos como a folha, e as nossas iniqüidades como um vento nos arrebatam” Is 64:6. Nenhum cerimonial, ou ritual religioso, pode purificar os nossos pecados: “Por isso, ainda que te laves com salitre, e amontoes sabão, a tua iniqüidade está gravada diante de mim, diz o Senhor DEUS” Jr 2:22.  A situação humana é irremediável diante de Deus. É imprescindível o arrependimento dos pecados e a confiança na obra salvadora de Cristo, na cruz do Calvário: “E, tirando-os para fora, disse: Senhores, que é necessário que eu faça para me salvar? E eles disseram: Crê no Senhor Jesus Cristo e serás salvo, tu e a tua casa” At 16:30, 31.

Muitos preferem crer e encontrar sua “justiça” nas forças ocultas. No Brasil, por exemplo, o dia 02 de fevereiro é considerado pelos baianos um dia de se fazer homenagens a Iemanjá – tida por seus adeptos como “rainha das águas”. Mas as pessoas continuam nos seus pecados e ignoram que a “justiça” proporcionada por Deus é salutar e imprescindível à vida eterna: “Bem-aventurado aquele cuja transgressão é perdoada, e cujo pecado é coberto” Sl 32:1.

No sentido ético, os famintos e sedentos por justiça anseiam que a sociedade seja mais humana e justa, que os juízes julguem adequadamente, que os políticos não se corrompam, que não haja tanta violência, que as pessoas se libertem dos vícios destruidores, que os miseravelmente pobres tenham pelo menos as condições básicas para sobreviver. Mas isso é algo que só será uma realidade se as pessoas forem regeneradas por Cristo, no entanto, os cidadãos do reino se entristecem por tanta injustiça social e anseiam por uma sociedade relativamente melhor. Os que assim desejam, serão saciados. Este estado de saciedade, entretanto, refere-se ao caráter forense de justiça, ou seja, os méritos de Cristo são imputados aos que não confiam na sua própria justiça.  

A quinta bem-aventurança refere-se aos misericordiosos. Segundo certa definição “misericórdia é amor demonstrado em favor de quem vive em desgraça, e um espírito perdoador para com o pecador”. A ilustração da parábola do Bom Samaritano, em Lucas 10, exemplifica o primeiro caso. Jesus decepcionou o intérprete da lei quando lhe disse que, para herdar a vida eterna, além de amar a Deus sobre todas as coisas deveria amar a seu próximo como amava a si próprio. Jesus desfaz seu entendimento de que se próximo era apenas alguém natural da sua nação, mas todo aquele que necessitar de ajuda, inclusive alguém odiado por ele. Ele não podia acreditar no que Jesus acabara de lhe ensinar, quando lhe disse para fazer ao seu próximo o mesmo que o samaritano fez a um judeu ferido.  A parábola do credor incompassível ilustra o segundo caso (Leia Mateus 18.23-35):

Os que conhecem a misericórdia de Deus devem agir segundo o principio da misericórdia. Se não mostrarem misericórdia, mas insistir na justiça, não receberão misericórdia, mas justiça. Um coração que não perdoa é um coração não perdoado, e está sujeito ao tormento até que pague toda a dívida. Um coração verdadeiramente perdoado é resultado do nascimento espiritual (Jo 3.3). Bíblia de Estudo de Genebra

A sexta bem-aventurança trata dos que possuem coração puro. Não devemos entender os limpos de coração como se fossem as pessoas sinceras, honestas, boas. Até mesmo porque, estas, continuam sendo essencialmente pecadoras diante de Deus e sua pureza de coração não representa o tipo ensinado por Jesus. Conforme o comentarista bíblico William Hendriksen é “evidente que a bênção da sexta bem-aventurança não é pronunciada indiscriminadamente sobre todos quantos são sinceros, mas, antes, sobre aqueles que, em sua adoração ao Deus verdadeiro, em consonância com a verdade revelada em sua Palavra, se empenham sem hipocrisia para agradá-lo e glorifica-lo”. A bem-aventurança consiste em que “verão a Deus”. Esta visão de Deus é a percepção do Ser de Deus e dos seus atributos, é o deleite Nele, é a esperança de que um dia O verão “face a face”: “Porque agora vemos por espelho em enigma, mas então veremos face a face; agora conheço em parte, mas então conhecerei como também sou conhecido” 1 Co 13:12.

A sétima bem-aventurança diz respeito aos pacificadores. Os pacificadores são os que receberam a reconciliação em Deus, por meio da cruz de Cristo, agora, buscam serem instrumentos de Deus para oferecer ao mundo tanto a paz espiritual quanto uma paz social. É claro que no contexto bíblico trata-se de paz espiritual, pois na verdade a possibilidade da paz social seria decorrente da paz espiritual, proporcionado pela morte de Cristo na cruz do Calvário: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou; não vo-la dou como o mundo a dá. Não se turbe o vosso coração, nem se atemorize” Jo 14:27. Alguém poderia indagar que, segundo o próprio Jesus disse em Mateus 10.34-36, sua vinda não seria assim tão pacífica. Mas, esta situação não é por culpa de Cristo, e, sim do homem.  Por desejarem a pacificação, a bem-aventurança consiste em que serão filhos de Deus, no sentido que “penetraram na própria esfera de atuação de Deus”.

Infelizmente, para não me tornar enfadonho demais ou  desnecessariamente prolixo, deixarei de comentar sobre as outras duas bem-aventuranças, expostas nos versículos 10 e 11 de Mateus 5. Porém, sugiro a leitura do excelente livro Sermão do Monte, do autor Martyn Lloyd-Jones, que servirá como fonte de conhecimento e edificação espiritual.

Para encerrar: pergunto aos teólogos da prosperidade se teriam coragem de pregar o Sermão do Monte aos seus adeptos, visto que ele contraria os propósitos materiais deles, mas, faz parte de todo o conselho de Deus.

Que o Senhor nos ajude a termos caráter de quem tem Deus governando verdadeiramente nos corações e na vida.  

Em Cristo,
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