Por Gilson Barbosa
Quando os crentes observam a
preocupação das pessoas em frequentar academias, realizar cirurgias plásticas,
usar cosméticos, engajarem-se na política, falar sobre sexualidade, quase
sempre possuem a tendência de demonizar
esses procedimentos como se isso em si fosse maligno, tendo como base que as
coisas espirituais é que devem ser priorizadas. Lembro-me de certo estudo bíblico
onde o pastor implicitamente tentava “convencer” os irmãos a não praticarem exercícios
físicos usando como base I Timóteo 4.8: “Porque o exercício corporal para pouco aproveita, mas a piedade para tudo é
proveitosa, tendo a promessa da vida presente e da que há de vir”. Na verdade, o
apóstolo Paulo não está desprezando o exercício físico, mas usa-o como
ilustração para a busca de uma vida de exercícios e objetivos espirituais.
No relato da criação o Senhor
cria o corpo do homem antes da alma. Note que é dito que “formou o Senhor Deus
o homem do pó da terra” antes mesmo de dizer que “soprou em suas narinas o
fôlego da vida” (Genesis 2:7). O resultado disso foi que “o homem foi feito
alma vivente”. Moisés narra que o homem possui uma natureza una: corpo e
alma/espírito. Devemos entender corpo,
alma/espírito como aspectos da natureza humana e não como partes separadas e
individuais entre si; trata-se de uma unidade plena e total.
Por não entender dessa forma os
crentes tem considerado o aspecto físico do ser humano como inferior ao
espiritual; a natureza espiritual superior a material. É como se Deus não se importasse de forma alguma com a natureza
física da pessoa. Considerar uma parte inferior à outra é adotar uma visão
dualista da criação. O irmão Alceu Lourenço Jr. afirma que “o dualismo entrou
para o pensamento cristão por meio da influencia da filosofia platônica grega
sobre importantes pensadores cristãos da antiguidade”. Dessa forma toda a
produção cultural ou artística, tais como a música, artes, pintura, cujo tema não
fosse religioso, não era valorizada e deveria até mesmo ser evitada. Os
Reformadores trataram de corrigir esse desvirtuamento com a cosmovisão
estruturada em três categorias bíblicas: Criação, Queda e Redenção.
As estruturas: Criação, Queda e Redenção
Na criação destaca-se o
fato de que o mundo foi feito originalmente por Deus e que tudo é sustentado continuamente
pelo seu poder. O mesmo Deus que cria e chama o universo à existência, é o
mesmo que preserva e mantém sua criação. Sua criação é perfeita e boa (Genesis
1.31). As denominadas “leis naturais” nada mais é do que o ordenamento de Deus
para a manutenção de sua criação. O Senhor criou o Sol e a lua, mas também
determinou que eles se movimentassem regularizando dias e estações do ano de
maneira que permitem a continuidade da vida sobre a terra. O Senhor criou o
mar, mas imagine se Ele não estabelecesse o limite das águas do mar na praia?
Enfim, o que pretendo dizer é que a cultura criada pelo Senhor é boa e deve ser
desfrutada pela humanidade.
Na queda percebemos como
a boa criação de Deus foi deturpada e sofreu degeneração. A maldição pelo
pecado alcança imediatamente a fisiologia feminina, os relacionamentos humanos,
o reino vegetal e, por fim, a própria vida humana. A queda trouxe como consequência
à mulher, o parto trabalhoso para ter filhos e a subordinação ao seu marido. O
trabalho de cultivar e cuidar do jardim eram realizados por Adão de maneira não
sofrida, tranquila. Após a Queda, o objeto do trabalho do homem, a terra, torna-se
maldita e deverá oferecer resistência “as suas enxadadas”. Em fadigas Adão extrairia
seu sustento da terra e a partir de então ela produziria espinhos e cardos. Os relacionamentos
pessoais foram afetados quando observamos que a harmonia vivida pelo casal é
quebrada com acusações mútuas de culpa. Por fim, Adão que sem a queda em pecado
deveria ter uma vida mais plena e nunca ficaria doente, é sentenciado pelo
Senhor a degeneração física e morte.
Na redenção a humanidade
recebe, em Cristo, uma nova oportunidade e é restabelecida como administradora
de Deus sobre toda a criação. Cristo morreu na cruz do Calvário não apenas para
redimir a alma, mas a totalidade da criação. Em Cristo cada aspecto da criação
que foi corrompido pelo pecado é redimido. Os sinais, milagres, curas e
exorcismos praticados pelo Senhor Jesus tinham como objetivo uma demonstração
poderosa da vinda do Reino de Deus. Obviamente, este reino só terá cumprimento
pleno e total na eternidade. A razão
da redenção efetuada por Cristo na cruz do Calvário visa resgatar a cultura,
as artes, a música, os relacionamentos, a pintura, o teatro, a política, etc, e
não somente a alma/espírito.
A Redenção da Cultura
Quando o crente deprecia as
coisas boas criadas pelo Senhor e as vê apenas como produto da Queda, a tendência
é um relacionamento conturbado com o mundo em sua volta e consigo mesmo. Seu comportamento
com relação ao sexo, música, artes, teatro, política, beleza e entretenimento será
sempre o de demonizá-los. É necessário retomarmos o potencial original da
criação estruturada de maneira perfeita pelo Senhor. Para alguns crentes tudo é
pecado e o Diabo criou a má cultura. Mas, Cristo morreu na cruz para restaurar
sua criação original. Apreciar um quadro, uma peça teatral, uma boa música, um bom
programa de televisão, um bom filme, não é pecado. Se quiser viver como um
ermitão, por favor, converta-se em um monge e vá para o deserto. Caso
contrário, glorifique a Deus pelo seu trabalho (e em plena segunda-feira),
louve a Deus pelas pessoas que não são crentes ainda, componha uma boa música,
escreva uma poesia, invente algo, plante uma árvore, transforme a má cultura
numa cultura cujo nome do Senhor seja glorificado.
Espero fazer-me entendido por
vocês. No amor de Cristo.
0 comentários:
Postar um comentário