por Gilson Barbosa
Influenciados pelo movimento da “confissão
positiva” (popularmente conhecida como “teologia da prosperidade”), inúmeros
evangélicos tem se afastado do verdadeiro sentido de fé, nas escrituras. A fé deles bem pode ser chamada de autoajuda,
otimismo, motivação. Preciso dizer que não sou uma pessoa pessimista e afirmo
que em certo sentido devemos manter uma atitude positiva em relação a muitas
coisas na vida. Porém quando misturamos fé evangélica com questões humanas e
seculares, sempre distorcemos o real sentido que a Bíblia atribui à fé.
As empresas, por exemplo,
precisam injetar em seus funcionários uma boa dose de otimismo e motivação. Até
aí tudo bem. O negócio começa a criar ares de gravidade quando o ser humano é
instado a refletir sobre sua condição de quase um semideus. O amor a si próprio,
que é legítimo (leia Marcos 12:31), é transformado numa idolatria humana. Tudo
isso para que a pessoa se sinta capaz de conquistar metas cada vez maiores e
obter sucesso. A pessoa passa da sadia avaliação de sua autoimagem a uma
adoração do seu próprio eu. Creio que um crente envolvido nesse contexto deve
ter muito discernimento para não aceitar essa metodologia como advinda da parte
de Deus. O grande equívoco do ser humano tem sido a de buscar sua própria
autonomia. Infelizmente muitas igrejas utilizam os mesmos métodos empresariais
de motivação e autoajuda para dinamizar seus membros.
Os líderes da “teologia da
prosperidade” dizem até mesmo que não devemos orar tendo como perspectiva a
vontade de Deus, pois isso caracteriza falta de fé ou dúvida. Na oração não devemos
usar a expressão “se for da tua vontade”. Kenneth Hagin disse o seguinte:
Quando oro uma
“oração para receber algo da parte de Deus”, não posso colocar um “se” no meio
e ainda esperar que algum dia receberei uma resposta. Nesse tipo de oração, o “se”
indica a descrença – “se” é o distintivo da dúvida.
Parece que Hagin não leu sobre a
afirmação dos três jovens hebreus (Sadraque, Mesaque e Abede-Nego) diante da
ameaça do rei Nabucodonosor de que se não adorassem a imagem construída para sua
própria honra seriam lançados na fornalha ardente. Diante da terrível ameaça de morte eles
responderam ao rei usando a condicional “se”:
Se
o nosso Deus, a quem servimos, quer livrar-nos, ele nos livrará da fornalha de
fogo ardente e das tuas mãos, ó rei. Se não, fica sabendo, ó rei, que não
serviremos a teus deuses, nem adoraremos a imagem de ouro que levantaste.
(Daniel 3:17,18)
O próprio Jesus orou ao Pai
suplicando que a sua vontade fosse feita: “faça-se a tua vontade, assim na
terra como no céu” (Mateus 6:10). É claro que devemos orar com fé, mas a fé tem
que ter como fundamento a vontade de Deus. Com essa petição, “faça-se a tua
vontade”, o Senhor Jesus está ensinando aos seus discípulos a dependerem
inteiramente da graça de Deus. Muitos irmãos exercem a fé na oração apenas no
sentido de se beneficiarem das bênçãos materiais que podem advir da parte de
Deus. Entretanto, isso pode não estar dentro da vontade de Deus para nós. Ademais,
Deus não está preocupado nem interessado em dar carrões de luxo, roupas de
grife, mansões com piscinas, ou coisas do gênero, para seus servos. Afirmar isso
é uma grande besteira. É só analisar a vida dos apóstolos e profetas e veremos
que nunca essas coisas passaram pela mente de Deus.
O Dr. Wendel Lessa declara que “fé
no contexto religioso contemporâneo, é apenas um sentimento subjetivo que deve
ser confirmado com realizações factuais e concretas no dia a dia”. Ou seja, é
algo compreendido no íntimo de cada indivíduo. Ele continua dizendo que “a
validade da fé depende do quanto ela é demonstrada objetivamente por meio de ‘bênçãos’
materiais, concretas e numeráveis”. Essa atitude lança culpa nos irmãos que estão
passando por diversas dificuldades. O problema está em não possuírem fé
suficiente.
Aliás, os proponentes da “teologia
da prosperidade” asseveram que devemos ter a
fé do tipo de Deus. A “base” para esse entendimento advém da história em
que Cristo amaldiçoa a figueira por causa da falta de fruto. Leiamos Marcos 11:
20-23:
E, passando
eles pela manhã, viram que a figueira secara desde a raiz. Então, Pedro,
lembrando-se, falou: Mestre, eis que a figueira que amaldiçoaste secou. Ao que
Jesus lhes disse: Tende fé em Deus; porque em verdade vos afirmo que, se alguém
disser a este monte: Ergue-te e lança-te no mar, e não duvidar no seu coração,
mas crer que se fará o que diz, assim será com ele.
O conceito de fé de Kenneth Hagin
é: “uma força que cria a realidade”. Segundo ele Deus criou o homem e o mundo,
por um ato de sua própria fé. Deus trouxe à existência aquilo que desejava em
sua mente por meio da fé. Isso é um absurdo. Em primeiro lugar porque o texto
bíblico diz “tende fé em Deus”, e os gramáticos afirmar não ser possível
traduzir por “tende a fé do tipo de
Deus”. Em segundo lugar causa estranheza dizer que Deus tem fé naquilo que vai
fazer. Deus é soberano, todo sábio, onipotente e não faz sentido ter que usar a
fé para criar qualquer coisa que desejasse.
Segundo a Escritura Sagrada a fé
bíblica “é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não
vêem” (Hebreus 11:1). A fé não é uma substância. Ele não crê em coisas absurdas
que não existem. As expressões são bem claras: “coisas que se esperam”, “convicção
de fatos”. O mais importante da fé está no seu objeto. Quem é o objeto da fé?
Cristo? Deus? Muitos têm feito da própria fé objeto da fé. É o que os teólogos
afirmam ser a “fé na fé”. Esse tipo de exercício não é a fé nas promessas de
Deus ou nos seus planos, mas a fé no que eu posso ter, conquistar, realizar. Esse
pensamento é tanto extrabíblico quanto antibíblico.
Não sou contra os irmãos que gostam
de usar frases positivas, otimistas, que expressam confiança. Sou desfavorável a
usarem isso como se fossem doutrinas bíblicas ou que se esqueçam de que Deus
nem sempre nos livra de sofrimentos ou dificuldades. Ele nem mesmo tem a
obrigação de nos isentar de tais sofrimentos. A obrigatoriedade da fé para a
conquista de bênçãos terrenas tem levado muitos irmãos a um sentimento de
fracasso espiritual e de culpa. Por outro lado outros se consideram mais
espirituais por terem conseguido algo que atribuem a resposta de Deus para suas
orações. Nem uma coisa nem outra. O que prevalece é a vontade de Deus. Muitos
personagens bíblicos não tiveram suas orações ouvidas ou desejos atendidos pelo
Senhor. Pense nisso e não ficará frustrado.
Não apoie sua fé nas
circunstancias temporais. Nem por isso desanime ou desista dos seus objetivos.
Continue aprimorando suas habilidades para obter sucesso no seu trabalho, na
escola e até mesmo na igreja. Continue orando para que o Senhor abra as portas
que aparentemente estão fechadas para você. Mas, sobretudo dependa totalmente
do Senhor em todas as coisas e atribua louvor a Ele quando tudo concorrer para
o seu bem. Não confie em você mesmo. Não use a fé como instrumento de
conquistas terrenas.
Com amor,
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