Por Gilson Barbosa
A igreja é tanto um organismo quanto uma organização. Como organismo ela é a reunião de todos os crentes salvos, em todo lugar e ao longo de toda a história, e, a denominamos de igreja invisível ou o corpo místico de Cristo. Neste sentido a Igreja é perfeita e livre de impurezas. Porém, outro sentido é o de organização, o que significa que é constituído de exigências burocráticas que se traduzem nos livros de atas, estatutos sociais, serviço social, templos físicos, diretoria, e outros do gênero. Uns espiritualizam demais a Igreja olhando-a apenas pelo prisma místico; outros, no entanto, a tratam tão profissionalmente que ela se torna mais um corpo social do que um organismo vivo. Na Igreja Primitiva esses dois aspectos de Igreja ficam bem nítidos. Primeiramente, os apóstolos se preocupavam, especialmente, com os aspectos espirituais tais como pregação evangelística, dons espirituais, oração cotidiana, comunhão fraternal. Contudo, isso não significa inexistência de pessoas necessitadas materialmente (At 2.45) ou que os apóstolos não cuidavam destes (At 4.35).
Um problema social
Como todas as demais instituições o crescimento da Igreja demandou certas exigências e uma preocupação com questões ligadas à administração social, o que tornou urgente à delegação de responsabilidades a outras pessoas ligadas a ela. Isso se tornou evidente “quando os judeus de fala grega entre eles queixaram-se dos judeus de fala hebraica porque suas viúvas estavam sendo esquecidas na distribuição diária de alimento” (At 6.1 – NVI). Depreendemos desse texto que a Igreja Primitiva era constituída inicialmente de crentes judeus, e não de gentios: “os de fala grega” e os de “fala hebraica”. Muitos judeus dispersos, desde o cativeiro babilônico, não retornaram para a Palestina e se espalharam entre as nações (At 2.9.11). Estes foram influenciados pela cultura grega e utilizavam coloquialmente o idioma grego também; já outros eram judeus nativos ou os que retornaram após o cativeiro, para a região da Palestina. Assim como havia, inicialmente, na Igreja de Jerusalém dois grupos de judeus, em situações diversas, há também na igreja local (onde congregamos) uma mescla de fatores tais como os sociais, étnicos, raças, natureza humana, que demandam da liderança eclesiástica uma visão apurada a fim de que os membros permaneçam em comunhão. Apesar dos apóstolos não detectarem rapidamente o problema, não foram omissos e agiram com seriedade quando aquele veio à tona: “Por isso os Doze reuniram todos os discípulos e disseram: "Não é certo negligenciarmos o ministério da palavra de Deus, a fim de servir às mesas” (6.2).
Instituição de diáconos
O fardo, proporcionado pelas tarefas na igreja incipiente, deveria ser distribuído com urgência e dessa decisão organizacional origina o que entendemos ser a instituição dos diáconos. Os apóstolos não poderiam deixar de pregar a palavra de Deus, mas também não podiam negar a assistência social às viúvas do grupo judaico-heleno da Igreja Primitiva. Aqui vemos o cuidado apostólico aos menos favorecidos na sociedade eclesíastica e quanto a esse tipo de situação Deus sempre se preocupou. No Antigo Testamento notamos a preocupação de Deus com os estrangeiros, órfãos, pobres, viúvas e Dele é dito que “faz justiça ao órfão e à viúva, e ama o estrangeiro, dando-lhe pão e roupa.” (Dt 10.18 – ACF). Contrariando os adeptos da Teologia da Prosperidade a Bíblia registra: “Pois nunca deixará de haver pobres na terra; pelo que eu te ordeno, dizendo: Livremente abrirás a mão para o teu irmão, para o teu necessitado, e para o teu pobre na tua terra” (Dt 15.11 – A.A). No caso das viúvas, em Atos 6, elas “estavam sendo esquecidas na distribuição diária”. A versão bíblica Almeida Corrigida e Fiel denomina esse ato de “ministério cotidiano” (v.1). e a importância de tratar essas irmãs com responsabilidade nota-se pelo uso equivalente quanto ao “ministério da palavra” (v.4) que os apóstolos deveriam se ater.
Dados importantes indicam que 1) os primeiros crentes eram chamados de discípulos (v.1, 2,7); 2) a escolha dos diáconos partiu democraticamente da Igreja e não dos apóstolos (v.3 “escolhei”); 3) os apóstolos dedicariam tempo “na oração e no ministério da palavra” e 4) os diáconos serviriam às mesas. A expressão “servir às mesas”, tanto significa servir as refeições quanto a distribuição de fundos aos que necessitavam. A igreja atual não deve nem pode esquecer os irmãos mais carentes e dispensar a eles tratamento equânime. O apóstolo Tiago lembra que “A religião pura e imaculada para com Deus e Pai, é esta: Visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e guardar-se da corrupção do mundo” (Tg 1.27); ou seja, cuidados espirituais, mas também materiais.
Organismo e organização
David J. Williams comenta que “assim foi que a igreja, num contexto de oração e de espírito de boa vontade, pôs a casa em ordem. Manteve-se a unidade. Temos a impressão de que essa resolução trouxe renovada bênção — ‘crescia a palavra de Deus’; noutras palavras, a pregação apostólica de Cristo era ouvida por mais e mais pessoas, e conseqüentemente ‘em Jerusalém se multiplicava rapidamente o número dos discípulos”’.[1]
Jamais devemos discriminar ou agir com preconceito quanto aos crentes necessitados em nossa Igreja. Em algumas igrejas há um tratamento pessoal diferenciado quando se trata dos que são ricos e independentes em contraposição aos pobres e dependentes do assistencialismo eclesiástico. Aos que procedem desta maneira a voz de Tiago (2.9) ecoará: “Mas, se fazeis acepção de pessoas, cometeis pecado, e sois redargüidos pela lei como transgressores”. Tanto ao pobre quanto ao rico devem ser dispensados favores essencialmente iguais na comunidade cristã “porque, para com Deus, não há acepção de pessoas”. (Rm 2.11).
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