terça-feira, 13 de março de 2012

SE DEUS É BOM POR QUE PERMITE TANTAS TRAGÉDIAS?

Por Leandro Antônio de Lima*

Vivemos num mundo muito cruel. Raramente se vê a justiça triunfar, e os bons, geralmente são os que sofrem mais. Às vezes, dá a impressão de que Deus se esqueceu de ajudar aqueles que esperam nele. Quando olhamos para toda a desgraça que há neste mundo surge a pergunta: Como poderia um Deus bom permanecer impassível diante de tanta desgraça? Como um Deus bom poderia permitir que bebês morressem na infância; que crianças morressem de fome em meio à pobreza ou guerras; que alguns tenham tanto privilégio enquanto outros tanta escassez; que o injusto domine sobre o justo; e que muitos fiéis sejam perseguidos e mortos sem temor nem piedade?

A Escritura afirma que “Deus é amor” (1 Jo 4.8,16), demonstrando que o amor faz parte da própria essência de Deus. Amar é algo absolutamente natural em Deus.

Em sua bondade, Deus não manifesta seu amor apenas para seu povo, ele é bom para com todas as pessoas e coisas criadas. O salmo 145.9 diz: “O Senhor é bom para todos”. Ou seja, a Escritura atesta a bondade de Deus, mas como harmonizar isso com as tragédias do mundo? Queremos insistir em que o fato de Deus demonstrar amor, graça, misericórdia e paciência para com os homens deve ser suficiente para aceitarmos e entendermos que ele é de fato bom. Porém, somente a fé nos faz aceitar a bondade divina. Com isso em mente, vamos pensar na questão das tragédias que acontecem neste mundo.

Será que elas de alguma forma comprometem a bondade ou a justiça de Deus? A primeira coisa que deve ser entendida é que Deus não está satisfeito com o estado caótico do nosso mundo, e nem foi ele quem desejou que o mundo caísse neste estado. Foi uma escolha do homem que trouxe todas as desgraças desta vida.

Quando Adão escolheu pecar, sabia das consequências, pois Deus havia lhe avisado (Gn 2.17). E após seu pecado, Deus ordenou a maldição sobre este mundo, dizendo: “Maldita é a terra por tua causa” (Gn 3.17). Como consequência da maldição, o mundo virou um caos em todos os sentidos. Os descontroles da natureza e a maldade do homem seriam constantes em toda a história do mundo. A Bíblia descreve que a natureza “geme e suporta angústias não voluntariamente” (Rm 8.22), o que nos sugere que todas as catástrofes que acontecem neste mundo são consequências forçadas por causa do pecado. Não propriamente pelo pecado de cada homem, mas pelo estado decaído da humanidade e do mundo. A bondade de Deus se manifesta justamente pelo fato de que ele poderia ter deixado o mundo entregue ao seu próprio destino, mas não o deixou. Deus tem providenciado uma redenção completa para este mundo.

Chegará o dia em que a “criação será redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus” (Rm 8.21). Até lá teremos de conviver com as desgraças desta vida, embora sempre tenhamos em Deus o nosso refúgio seguro, bem presente na tribulação (Sl 46.1).

Muitos crentes acreditam numa espécie de triunfalismo pseudocrístão. Pensam que um fiel não passa por dificuldades, que não pode ter problemas financeiros ou ficar doente. Em geral, esses problemas são atribuídos ao Diabo, e pensa-se que, passar por tais dificuldades, evidencia falta de fé.

Pastores ensinam os crentes a se considerarem vitoriosos sobre todos os problemas, pois são filhos de Deus, e não é justo que sofram. Devem exigir na prática o status que desfrutam como “príncipes”. Diante das dificuldades basta orar e decretar que o problema não mais existe e ele sumirá.

Basta profetizar vitórias e todos os problemas desaparecerão. O que essa forma de pensar ignora é que o mundo está debaixo da maldição do próprio Deus, e que o fato de um homem ser crente não impede que nasçam ervas daninhas em seu quintal, nem que sua esposa tenha dores de parto (Gn 3.16-18). Esses são exemplos da maldição do mundo citados pelo próprio Deus.

Outra coisa que essa forma de pensar ignora é que o próprio Deus pode enviar provações para amadurecer os crentes. A Bíblia claramente demonstra que Deus permite que venham tribulações sobre a vida dos crentes a fim de purificar a fé. Pedro diz que os crentes deveriam se alegrar, mesmo que no presente, por breve tempo, se necessário, fossem contristados por várias provações. Segundo ele, isso aconteceria “para que, uma vez confirmado o valor da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro perecível, mesmo apurado por fogo, redunde em louvor, glória e honra na revelação de Jesus Cristo” (1 Pe 1.6, 7). As provações da vida redundam no louvor de Jesus.

O triunfalismo alegadamente cristão impede que as pessoas tenham as maiores e mais verdadeiras experiências com Deus, e nunca levará uma pessoa a um nível espiritual mais elevado. Ignora a verdade de Romanos 8.28: “Sabemos que todas as cousas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”. O propósito de Deus é que sejamos conforme à imagem de Cristo (Rm 8.29). Deus usa todas as coisas, inclusive o sofrimento para o nosso crescimento. Tiago escrevendo aos perseguidos crentes da dispersão disse: “Meus irmãos, tende por motivo de grande alegria o passardes por várias provações” (Tg 1.2). Esse apóstolo está dizendo que os crentes devem se alegrar nas provações que enfrentam nessa vida, não porque sejam “masoquistas”, pessoas que gostam de sofrer pelo prazer de sentir dor, mas porque Deus tem um propósito até mesmo com o sofrimento. Tiago afirma que as provações vão trazer perseverança aos crentes, o que por sua vez os tornará maduros na fé (Tg 1.3-4). Creio que é nesse sentido que devemos entender Romanos 8.28. Nesta vida, muitas coisas que nos acontecem são ruins, e mesmo as suas consequências imediatas não são boas, por isso também, precisamos entender que esse bem pode ser um “bem final”, aquilo que tem a ver com o propósito de Deus, pelo qual ele chamou os crentes.

A impunidade dos maus neste mundo é uma das coisas que levam as pessoas a desconfiar da bondade de Deus. Mas as tragédias e a impiedade deste mundo não comprometem a bondade e nem a justiça de Deus porque ele mantém tudo sob controle, e no devido tempo, retribuirá com justa medida a cada um segundo o que tiver feito. Uma coisa é certa, todos receberão de Deus o que merecem. A resposta do salmo 115 à pergunta “onde está vosso Deus” foi a seguinte: “No céu está o nosso Deus e tudo faz como lhe agrada” (Sl 115.3). Deus habita os céus onde está seu trono, de onde ele governa a tudo e a todos, e de onde ele executará sua justiça sobre tudo e sobre todos, ainda que seu amor, graça, misericórdia e paciência muitas vezes retardem sua ira. Tudo o que acontece, por mais estranho que seja, acontece como lhe agrada, ou seja, é segundo a vontade dele. Porém, se olharmos somente para o agora, não veremos a bondade e muito menos a justiça de Deus de forma completa, por isso, precisamos olhar para o futuro, para o fim dos ímpios. Lá veremos outra vez a diferença entre o justo e o perverso. Nunca devemos nos esquecer que haverá um juízo final. Na verdade, a única garantia de que a Bondade e a Justiça de Deus serão finalmente vindicadas é que existe um Juízo Final.

A maior de todas as provas de amor que Deus concedeu aos homens foi vista no ato de entregar seu Filho por nós. Romanos 5.8 declara: “... Deus prova o seu próprio amor para conosco, pelo fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda pecadores”.

Em meio às dificuldades da vida devemos continuamente olhar para o sacrifício de Cristo que nos dá a certeza de seu amor. É verdade que Deus nos concede dádivas porque nos ama; mas, porque ama, a Escritura também diz que ele disciplina, conforme está escrito em Apocalipse 3.19: “Eu repreendo e disciplino a quantos amo”.

Deus não demonstra seu amor apenas quando nos concede benefícios, mas também quando permite que certas coisas ruins nos atinjam com o propósito de nos disciplinar, testar, ou de nos fazer crescer na dependência dele. Por isso, em toda e qualquer situação que tenhamos que enfrentar, precisamos olhar para o Calvário e dizer: sim Deus me ama, pois entregou seu Filho por mim.

* O Rev. Leandro Antônio de Lima é pastor titular da IP de Santo Amaro, São Paulo, e membro do Conselho Editorial do Jornal Brasil Presbiteriano.

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