William Barclay
Vimos que a Igreja em Esmirna estava lutando contra dificuldades e que a ameaçavam dificuldades ainda maiores no futuro imediato. É porque o autor tem isto em mente que a carta começa com a menção dos títulos atribuídos a Cristo, nos quais ele nos sugere quais são as coisas que Cristo pode oferecer aos que se veem frente a uma situação similar à que viviam os cristãos em Esmirna.
(1) Cristo é o primeiro e o último. No Antigo Testamento este título pertence a Deus. Isaías ouviu Deus dizer. “Eu sou o primeiro e Eu sou o último” (Isaías 44:6; 48:12). Este título tem dois aspectos. Para o cristão é uma magnífica promessa. Seja o que for que aconteça do primeiro dia da vida até o último, com toda a colorida variedade de experiências que podem suceder, sejam boas ou más, o Cristo ressuscitado está conosco.
Temos sua palavra de que Ele estará conosco sempre, até o fim do mundo. A quem temeremos, então? Quem poderá nos assustar? Mas para os pagãos de Esmirna estas mesmas palavras são uma advertência. Amavam a sua cidade. Chamavam-na a primeira da Ásia e estavam dispostos a discutir com qualquer pessoa sua qualidade de principal. Viviam num mundo pequeno de vaidade provinciana, no qual todos competiam para ser melhores que os demais e ascender um degrau acima dos outros. Todos queriam ocupar os primeiros lugares e se esforçavam para obtê-los. Mas o Cristo ressuscitado diz “Eu sou o primeiro e o último”. Aqui se põe fim a todo orgulho humano. Junto à glória de Cristo todos os nossos títulos ficam reduzidos ao ridículo, carecem de importância real.
Quando o imperador Juliano fracassou em seu intento de fazer retroceder a trás a história, eliminando o cristianismo e restaurando a religião pagã, e quando seus esforços lhe custaram à vida, exclamou, antes de morrer: “Não era para eu expulsar a Cristo do lugar mais destacado”. O posto de preeminência pertence Àquele o que é o primeiro e o último; junto a Ele todas as nossas glórias humanas não são mais que vaidade.
(2) Cristo é aquele que esteve morto e tornou a viver. Neste versículo os tempos dos verbos são de primeiríssima importância. A palavra grega que traduzimos “esteve” é genomenos, que pode traduzir-se, com maior fidelidade, “chegou a estar”. Descreve um episódio, uma experiência transitiva, algo que sucedeu a alguém. Quando Cristo esteve morto, para Ele a morte foi uma experiência transitiva, um episódio de sua vida. Experimentou a morte e a venceu, e já não esteve mais morto.
Quanto à palavra “tornou a viver”, devemos notar que se trata de um verbo no tempo passado (em aoristo no grego), que descreve uma ação já realizada de maneira completa. A tradução correta seria “voltou à vida de uma vez por todas”. Faz-se referência, é obvio, ao evento da ressurreição. O Cristo ressuscitado é Aquele que experimentou a morte, passou através da morte, e saiu da morte; voltou a viver, triunfante, pela ressurreição, e está vivo para sempre jamais. Aqui também há dois aspectos, mas desta vez ambos são para que o cristão tome nota deles.
(a) O Cristo ressuscitado tem a experiência do pior que a vida nos pode oferecer. Sofreu a agonia e a agonia de uma cruz. Não importa o que suceda aos cristãos de Esmirna, Cristo tinha vivido ainda pior. Jesus Cristo pode nos ajudar porque Ele conhece as maiores amarguras da vida, e ainda tem experiência da morte. Nada nos pode suceder que não tenha sucedido, e ainda pior, a Ele.
(b) O Cristo ressuscitado conquistou o pior que a vida pode nos oferecer. Triunfou sobre a dor, triunfou sobre a cruz, triunfou sobre a morte. Não nos oferece algo que Ele mesmo não tenha conquistado em sua própria experiência e vida. E o que nos oferece é o caminho para uma vida vitoriosa.
Mas nesta passagem também há uma exigência, e a exigência nos pede lealdade. A exigência do Cristo ressuscitado é que seu povo lhe seja fiel até a morte, fiel mesmo quanto à própria vida seja o preço dessa fidelidade. A lealdade era uma virtude que os habitantes de Esmirna conheciam muito bem, porque sua cidade tinha comprometido seu destino com Roma e se manteve leal, até em épocas quando a grandeza de Roma não era mais que uma remota possibilidade. Nas horas boas e nas horas más manteve-se fiel a seu compromisso inicial. Não há nada neste mundo que possa ocupar o lugar da lealdade. Se todas as outras boas qualidades Que pode ter a vida fossem postas num pires da balança, e a lealdade, sozinha, no outro, a lealdade moveria o fiel da balança a seu favor.
R. L. Stevenson rogava a Deus que “na diversidade de minha fortuna, até que chegue a atravessar os portais da morte, sejamos leais e nos amemos mutuamente”.
O Cristo ressuscitado nos faz grandes ofertas e uma grande exigência. E é somente na fortaleza e na coragem que nos oferece que podemos satisfazer a lealdade que pede de nós.
0 comentários:
Postar um comentário