Por Gilson Barbosa
Capítulo VI
Este capítulo encerra a primeira classificação do documento: as instruções morais. O neoconverso deveria atentar para a instrução, observando as recomendações espirituais afim de que “ninguém o afaste do caminho da instrução” (VI. 1). O caminho da morte é freqüentado por muito mais pessoas, pois possui vastos elementos atraentes. Isto lembra o que nosso Mestre ensinou sobre os dois caminhos, no Evangelho (Mt 7.13). Certamente é desejo de Deus e do nosso Senhor Jesus Cristo que pratiquemos o que nosso mestre ensinou como preceitos da fé cristã – quer ordens positivas bem como as negativas. “Levar todo o jugo do Senhor” (VI.2), realmente, é uma meta que deve ser buscada individualmente pelo cristão. Além do mais, nosso Senhor disse no Evangelho (Mt 11.30) que o “seu jugo é suave e o seu fardo, leve”. Se na nossa carreira cristã é impossível levarmos, plenamente, o jugo do Senhor, “devemos fazer o que puder” (VI.2).
Capítulo VII
Deste capítulo até o 10º temos instruções a respeito de procedimentos litúrgicos. Partimos do pressuposto que detalhes litúrgicos são secundários em matéria de fé. Não devemos dar excessiva ênfase em assuntos onde a Bíblia trata com certa relatividade e pouco destaque. A importância não se encontra no ato litúrgico, mas, na doutrina em que está inserido este ato. O certo é que não devemos nos prender a questões que, na verdade, apenas evidenciam diferenças denominacionais. Há três pontos interessantes neste capítulo: a fórmula batismal, o modo do batismo e a questão do jejum precedente ao batismo.
Há grupos religiosos que criaram fórmulas alternativas no ato batismal. É caso das defensoras da teologia feminista, em países de língua inglesa, e alguns grupos sectários conhecidos como unicistas. O primeiro grupo observa nas expressões Pai e Filho tendências machistas. O outro, se apóia em textos restritos que supostamente embasa a idéia de que a fórmula correta é apenas no nome de Jesus. Não aceitamos a idéia de que alguém, indevidamente, colocou palavras na boca de Jesus quando Ele disse que o batismo deveria ser efetuado em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, advogados por alguns críticos. Os que pensam desta forma geralmente o fazem por negar a doutrina da trindade. O documento em estudo evidencia que os cristãos utilizavam a fórmula trinitariana.
Quanto ao rito batismal, ao longo da história, a igreja cristã tem reconhecido três modos: imersão, aspersão e infusão. A expressão “reconhecido” não significa, obviamente, concordância interpretativa quanto ao modo em que é aplicado nas diferentes denominações. Na melhor das hipóteses uma denominação aceita tolerantemente o modo da outra. Acreditamos ser este o caminho a seguir neste assunto. O Didaquê diz que o batismo deveria ser realizado em água viva. Outra tradução diz água corrente. Este é o primeiro modo na lista didaqueana. Dispomos de informações que os batismos eram, geralmente, efetuados às margens de algum rio ou fonte. Prossegue o documento: “se não tens água viva, batiza em outra água [...] e se não tens nem uma nem outra, derrama água na cabeça três vezes” (VII.1-3). O documento faculta o modo às necessidades do momento e entendemos que seu redator não está tão interessado no modo como no ato em si, em cumprimento da doutrina bíblica.
Outro ponto saliente é a questão de jejuar antecipadamente ao ato batismal. Aqui nota-se uma questão de um rito religioso contemporâneo aos interesses subjetivos pertinentes aos crentes da época. Não intencionamos julgar inadequadamente nossos irmãos por considerem este ritual importante. Talvez buscasse com isto estar totalmente preparado – interna e externamente – para o batismo. Porém, não entendemos ser este ato normativo aos nossos dias. Trata-se de uma questão pessoal e subjetiva.
Capítulo VIII
Reconhecemos a importância do jejum e em quais momentos devemos ater-nos a esta prática. Porém, o cristianismo não “encara” esta prática como um ritual apenas para distingui-los de outros grupos religiosos. Também não o consideramos como um ato de penitência. Não conquistamos favores graduais salvíficos, por intermédio desta prática, e nem alcançamos perdão dos nossos pecados. O Didaquê, contudo, preceitua que os crentes daqueles dias devessem jejuar em dias diferentes aos hipócritas (os judeus). Os hipócritas, segundo o redator didaqueano, “jejuam no segundo e quinto dias depois do sábado, mas vós jejuais o dia quarto e o da preparação” (VIII.1). Após criticar o modo como os hipócritas oravam – talvez arrogantemente – o instrutor reitera a oração do Pai Nosso. Então, após as instruções, finaliza: “Assim orareis três vezes ao dia”. Pelos relatos veterotestamentário observamos o hábito de muitos servos de Deus orarem obedecendo sistematicamente esta forma. Não desaprovamos este ato, pois, consideramos que eles conheciam a essência da oração. Sabiam que o mais importante era o ato em si e não o ritual. A ordem estabelecida objetivava a intenção benéfica de separar momentos para buscar a face de Deus. Porém, o cristianismo é a religião da liberdade e temos a oportunidade de orarmos a Deus não apenas três vezes, mas, muito mais e em todo o tempo.
Capítulos: IX-X, XIV
A ocasião eucarística era de suma importância para estes antigos cristãos. Era considerado tão sagrado que o documento adverte: “Se alguém é santo, aproxime-se; se não o é, arrependa-se” (X.6). Somente os que haviam sido batizados, portanto considerados em plena comunhão com os outros irmãos, é que deveriam participar: “Mas, ninguém coma nem beba de vossa Ação de Graças, a não ser os que foram batizados no nome do Senhor” (IX.5). A expressão Ação de Graças é uma tradução do termo grego eucaristia. Algumas denominações históricas utilizam o termo eucaristia. Outras preferem ceia ou ceia do Senhor. Não há necessidade em dogmatizarmos sobre qual a melhor expressão a ser utilizada para este ato. No documento temos redigido a formalidade precedente a participação dos crentes quanto aos elementos eucarísticos: pão e vinho. Este ato constava de orações litúrgicas introdutórias à celebração. Em algumas denominações hodiernas, antes da distribuição dos elementos, é lido o texto de I Coríntios 11.23-25. O dia escolhido para esta celebração era considerado por estes cristãos como o “dia do Senhor”. Historicamente, uma referência ao dia de Domingo: “Reunindo-vos no dia do Senhor, parti o pão e daí graças (XIV.1). Um ato considerado importante nesta reunião era o pedido de perdão caso o participante tivesse em desacordo ou desarmonia com seu irmão: “Mas, todo o que tenha contenda com seu companheiro , não se junte convosco até que se hajam reconciliado, a fim de que o vosso sacrifício não seja profanado” (XIV.2). Este ato era realizado pública, espontânea e audivelmente perante toda a congregação. Apesar das denominações não terem este hábito, em nossos dias, não revela essa atitude um procedência que proporciona edificação coletiva à igreja?
Era agregado à Eucaristia uma refeição comum conhecido como ágape. Segundo José Gonçalves Salvador “era costume, por esse tempo, uma refeição comum, juntamente com a Eucaristia, o Ágape. Parece que vinha antes das orações finais, pois o autor diz: “e depois de satisfeitos, daí graças assim” (X.1). Ambos ao anoitecer assim como Jesus fizera com seus discípulos. Mais tarde os dois passaram a ser realizados independentemente; a Ceia de manhã e o Ágape ao anoitecer. E como se vê, não se prescrevia o jejum por ocasião da Santa Ceia”.[1] Deve ser a este ato que Paulo exorta os crentes corintianos em sua primeira carta: “De sorte que, quando ajuntais num lugar, não é para comer a Ceia do Senhor. Porque, comendo, cada um toma antecipadamente a sua própria ceia; e assim um tem fome, e outro embriaga-se” (I Co 11.20,21).
Continua...
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